M16 – Parte 1

O M16 foi a base do modelo atual da linha de fuzis de assalto que os EUA adotam hoje. Mas a sua introdução não foi nada tranquila e satisfatória. O M16 era para ser um fuzil temporário até que os EUA decidissem qual fuzil seria usado pelas três forças armadas e no final se tornou definitivo. O M16 ainda não estava pronto para ir a uma guerra. Se deparou com uma série de problemas e erros de projetos que, mesmo sanados, se tornaram limitações até mesmo nas versões mais atuais. Entretanto o seu legado é incontestável é foi o 3º fuzil de assalto mais produzido do pós-guerra.

 

Origens

Terminada a 2ª G. M., os americanos tiveram contato com o StG44 e o primeiro fuzil de assalto da história havia impressionado pela possibilidade de controle em rajadas curtas com alto poder de parada a médias distâncias e um grande poder de fogo. Grandes calibres não permitiam isso, o que tirava a flexibilidade do soldado. Anos mais tarde, na guerra da Coreia, os americanos viram que o fuzil semiautomático M1 Garand era poderoso demais para os combates que se davam a curtas e médias distâncias. Os chineses e norte coreanos tinham um rendimento maior usando as submetralhadoras com um calibre 7,63 mm mais potente que os 9 mmP e .45ACP.

Soldado americano posa com um StG44 capturado.

Da mesma forma, os soldados americanos e sul coreanos que usavam a carabina M1 tinham também maior versatilidade ao carregar mais munição. Os americanos ficaram mais preocupados quando nos anos 50 descobriram que os soviéticos começariam a produção em massa de um fuzil de assalto usando uma munição intermediária. Estava claro que o calibre 7,62 x 63 mm e o recém adotado 7,62 x 51 mm estavam praticamente defasados.

 

O programa SCHV

Os EUA tentaram de alguma forma de aumentar as chances de acertos. O programa SALVO visava o uso de munições duplas e triplas em tandem dentro do cartucho. A ideia era uma maior quantidade de projéteis disparados de uma vez para aumentasse as chances de acerto sobre o alvo. Embora tivesse algum sucesso, havia grande dispersão e o recuo era maior, o que ia de encontro ao motivo do programa. Além desse, o programa SCHV (Program Small Caliber High Velocity) foi um estudo de um calibre mais leve, que fosse mais rápido e tivesse uma trajetória mais plana para aumentar a precisão, como forma de aumentar a eficiência da infantaria. Ao mesmo tempo, visava-se o maior controle da arma em rajadas curtas.

Nesse programa vários calibres foram feitos em .22 (5,56 mm) e os resultados foram muito satisfatórios. A maior surpresa foi a carabina M1 convertida ao calibre .22 spitfire (5,7 x 33 mm). O calibre era feito em cima do .30 carbine e os resultados foram acima do esperado. Os dois programas foram feitos visando as vantagens e desvantagens em cima do 7,62 x 51 mm.

Carabina M1 adaptada para o 5,7 x 33 mm.

Assim que o M14 foi adotado, o CONARC (Continental Army Command) pede informações para um novo fuzil. Entre os requisitos estabelecidos: peso máximo de 2,7 kg, semi e automático, trajetória com precisão de 450 metros, letalidade igual ou melhor do que uma carabina M1 a distâncias de até 450 metros e a munição deveria perfurar um colete balístico ou um capacete de aço a uma distância de 450 metros.

Logo após a avaliação do AR-10 e a adoção, os militares visitaram as instalações da ArmaLite falando sobre o programa SCHV. Os militares americanos gostaram da praticidade do design do AR-10 e de sua leveza. Eles disseram a Stoner a necessidade de um fuzil leve, menor, com uma munição nova .22. O fuzil deveria ter um carregador para 25 cartuchos porque eles temiam que com a munição nova o soldado desperdiçasse munição em automático. Eles avaliaram que os possíveis novos fuzis candidatos levariam 3 anos mas Stoner disse que seria necessário apenas 1 ano para eles.

Se lembram do AR-3, um dos primeiros fuzis desenhados por Stoner? Pois bem, ele usou esse modelo adaptado para um o calibre .222 Remington com um carregador de 25 cartuchos, chamado de AR-11. A arma funcionava, mas o calibre gerava fortes pressões internas, passando dos 55.000 Psi. Após testes de resistência, o cano explodiu e o projeto foi paralisado.

Da esquerda para a direita, o .222 Remington, o .223 Remington e o .222 Remington Magnum.

Aqui começa a dança dos calibres. No programa SCHV vários calibres surgiram e a ArmaLite decide trabalhar em cima do .222 Remington (5,56 x 43 mm). O calibre gerava altas pressões internas, o que poderia ser um problema. Stoner orienta a sua equipe para que um novo calibre fosse feito para o novo fuzil, um calibre que não gerasse tanta pressão interna. Em cima do .222 Remington eles criam o .222 Remington Special (5,56 x 45 mm). Logo depois a nomenclatura é alterada para .223 Remington 5,56 x 45 mm. Isso era para evitar o mesmo nome e qualquer tipo de confusão com o .222 Remington Magnum (5,56 x 46 mm), calibre destinado à caça de pequenos animais.

Como o AR-10 estava fora da concorrência, a ArmaLite decide usar ele como base para o novo fuzil de assalto. A última versão do AR-10 tinha um desenho técnico muito bom e em cima dele eles o usaram para o novo calibre. Ao contrário do que muitos pensam, não foi uma simples adaptação direta do calibre, porque o novo calibre também gerava pressões mais fortes que influenciava em várias peças da arma. O fuzil segue o que havia sido pedido. Era praticamente um AR-10 em miniatura. Um fuzil leve de 2,8 kg carregado, carregador de 25 cartuchos, cano de 508 mm de comprimento e uso de fibra de vidro na empunhadura, coronha e guardamão. As miras integradas eram apenas para demonstrar o conceito. Seguindo o modelo do AR-10, a janela de ejeção era protegida por uma tampa que se abria automaticamente após o 1º disparo.

Primeiro protótipo do AR-15.

O pedido era de 10 fuzis para avaliação mas a ArmaLite entregou 17 em 1958. Os fuzis desse lote estavam completos, mantendo as mesmas características. Como pedido, as miras eram mais fáceis de ajustar e limitadas, evitando que o soldado graduasse a distância desnecessariamente colocando em risco a precisão. Não foi somente a ArmaLite que foi sondada para um novo fuzil. A Winchester também havia sido procurada.

Já em 1956 eles apresentam o Winchester Light Weight Military Rifle, um fuzil leve, de 2,2 kg, ferrolho rotativo de dois ressaltos. O mecanismo de operação era de pistão de curso curto, como na carabina M1. O modelo da Winchester fica pronto poucos meses antes do AR-15. Isso foi um problema para eles, porque eles adotaram o calibre .224 Winchester sem as pesquisas necessárias. O calibre gerava uma pressão muita alta e foi adotado às pressas para cumprir os requerimentos de tiro. Além disso, o AR-15 dispara tanto o .222 como o .224 enquanto que o Winchester LWMR disparava somente o .224, que tinha um desempenho inferior.

Winchester LWMR.

Nos testes realizados viram que havia uma grande diferença. O fuzil de Winchester não conseguia atingir os requerimentos, dentre eles, transfixar um capacete de aço a 450 m. Outro grande problema era a espoleta do .224 que apresentava um grande índice de falhas. Ao passo de que o calibre usado pelo AR-15, o “.222 special”  não tinha nenhum problema de ignição, assim como transfixava os capacetes em todos os testes.

Como a Armalite já tinha experiência com o AR-10, eles fizeram pequenas alterações pontuais no AR-15. Essas alterações não foram implantadas de imediato mas gradativamente nos modelos posteriores. Diminuíram o peso do gatilho, aumentou se a proteção contra terra e pó na caixa da culatra, o cano tinha ranhuras onde acreditavam que dariam maior resistência, a rampa de alimentação foi redesenhada para evitar dupla alimentação, o cano ficou mais pesado, a introdução de um quebrachamas, a redução da capacidade do carregador de 25 para 20. A maior alteração visual e que perdura até hoje foi a alavanca de manejo. Ela deixa de ser posicionada na parte de cima da caixa da culatra e vai para a parte de trás da alça de transporte, continuando sendo ambidestra. Isso foi pedido porque o soldado que usasse luvas grossas de frio teria dificuldades para acionar a alavanca na posição original.

Em cima o AR-15 protótipo com a alavanca de manejo embaixo da alça de transporte e embaixo a versão posterior com a alavanca de manejo embaixo da alça de mira.

Os testes de 1958 trouxeram resultados que muitos não esperavam. As armas eram mais controláveis em fogo automático do que o M14. Os primeiros testes não eram oficiais, mas mostrou a diferença  nos testes com areia e lama. O AR-15 disparou 3.500 disparos com 6 falhas a cada 1.000 disparos. O recém adquirido T44 (M14) disparou 2.300 disparos com um índice de falha de 16 falhas por 1.000 disparos.

Nem tudo foi fácil para o AR-15. Nos testes de 1958 um dos canos explodiu. E isso não tinha nada a ver com a qualidade do material do cano. Isso ocorreu porque o cano era mais fino e com ranhuras, eram grandes sulcos que percorriam o cano. Com chuva ou situações que o cano recebe água, ao acumular, acaba por danificando o cano. Qualquer cano nesse calibre teria tido o mesmo problema. Descobriram que o interior do cano era mais fino por causa do calibre menor. A água ficava acumulada e nos disparos, as pressões, juntamente com a água agindo como obstáculo, fazia maior pressão no cano que, com o tempo, tendia a fadigar. Uma simples solução foi o cano mais pesado e sem ranhuras.

AR-15.

Embora com esses problemas, o AR-15 tinha se mostrado melhor no quesito geral. O CONARC decide por permitir que a ArmaLite e Winchester trabalhassem em seus modelos para que fossem melhorados. E deveriam solucionar o problema do projétil que se desintegrava quando transfixava um capacete de aço, pois . A Winchester, diante de seu projeto ainda não completo, decide por não concorrer mais com a ArmaLite, saindo do programa.

Cabe mencionar a Springfield. Ela tentou participar do programa com um modelo usando um ferrolho rotativo, semi, automático e com capacidade de burst de 4 disparos. O fuzil chegou tarde demais, mas o calibre .224 mais tarde foi explorado comercialmente como .222 Remingtom Magnum. Cabe reparar que no final dos anos 50, as empresas americanas ainda pensavam no layout do fuzil semiautomático convencional enquanto que a ArmaLite pensava em algo com o layout clássico do fuzil de assalto com empunhadura vertical.

Springfield .224.

 

Entra a Colt

Naquele momento os custos estavam aumentando e a ArmaLite estava ficando sem dinheiro. Com as poucas vendas do AR-10 e de outras armas civis, a ArmaLite precisava de uma nova fonte de renda. Nesse momento aparece a Colt. A Colt estava quase falindo, pois tivera só perdas depois da guerra da Coreia. Embora quase falida, tinha um capital maior que o da ArmaLite. Visando uma expansão de seus negócios, a Colt compra os direitos de produção e venda do AR-10 e AR-15, assim como qualquer outra arma feita com base no seu sistema de captação de gases, sistema esse patenteado. Isso deu uma sobrevida à ArmaLite porque foi com esse dinheiro que ela se manteve no programa de um novo fuzil de assalto para os EUA.

Funcionário da Colt demonstra o AR-15.

Visando exportações, em 1959 a ArmaLite e Colt passam a viajar pelo mundo ofertando o AR-10 e AR-15. Foram para a Itália e de lá, foram para a Ásia, passando pela Índia, a então Birmânia, Filipinas, Indonésia e Tailândia. E algo aconteceu. Todos queriam ver e testar o AR-15 e ninguém dava muita atenção ao AR-10. O fuzil era melhor em todos os aspectos. Isso fez com que a Colt parasse com todo e qualquer investimento no programa AR-10. Praticamente o fuzil morria nesse dia.

Muito se pensa que os EUA foram os primeiros a comprar o AR-15. A bem da verdade, foi a Malásia com 25 fuzis e a Índia com 23 fuzis no final de 1959. Depois vieram Austrália, Cingapura e Birmânia. A Filipinas é um caso interessante da política americana da época para com o AR-15. As Filipinas tinham um acordo com os EUA de financiamento de armas. Tal dinheiro seria usado para a compra de armas regulares das forças armadas americanas, como o BAR, pistola Colt 45, carabina M2 ou fuzil M1 Garand. Porém as Filipinas decidiram pelo AR-15, indo de encontro ao sistema americano que eles, em tese, deveriam seguir.

Ao contrário do que se pensa, foi a USAF e não o USARMY que teve interesse pelo AR-15. A USAF buscava um novo fuzil para substituir a carabina M2 que era usada pelo pessoal de terra, instalações, tripulações, etc. E eles achavam o M14 grande e pesado para isso. O governo americano não queria comprar um novo fuzil com o M14 recém adquirido. A Springfield ainda não tinha o ritmo de produção satisfatório do M14, que recém estava sendo produzido em massa. Caso o exército americano fosse mobilizado, não haveria tempo necessário para a produção seriada do novo fuzil. Levando em conta que a meta era um fuzil mais leve que o M1 Garand, sabiam que o M14 de leve não tinha nada. Se quisessem uma arma mais leve, seria mais fácil fazer a ultrapassada carabina M2 em massa do que o M14. Desta forma o governo americano defendia o prosseguimento do programa M14.

AR-15 produzido pela Colt.

A primeira tentativa de compra do AR-15 foi em 1959. Não deu certo. A Colt ofertou uma nova demonstração do AR-10 em 1960. Obviamente eles mostrariam o AR-15 como forma de pressionar o interesse pelo fuzil. Os primeiros testes impressionaram. O AR-15 tinha um índice de falhas menor que o M14, mesmo em condições adversas. E o que mais chamou a atenção foi a precisão, a quantidade de acertos no alvo com poucos disparos, coisa que não se conseguia com tanta facilidade com o M14. Logo veio mais uma bateria de teste comparativa agora com a carabina M2. De novo, o AR-15 impressionou a USAF. Eles queriam o fuzil, pois era justamente o que procuravam. Um pedido de 80.000 fuzis foi feito. Porém foi negado. A USAF tentou de novo em 1961 e nada. O governo americano se mostrava relutante com a ideia de dois fuzis diferentes nas mesmas forças armadas.

Para tentar ajudar, a Colt apresenta o AR-15 ao presidente Kennedy no mesmo ano, na própria casa branca. E novamente nada, embora o fuzil já estivesse escalonado para ser enviado ao Vietnã em quantidades pequenas para testes em condições reais de combate. A tentativa de persuadir a compra mostrando o fuzil ao presidente Kennedy se dava em função do iminente anúncio de aumentar a ajuda americana ao Vietnã do Sul, o que poderia ajudar na venda do fuzil às forças armadas americanas.

Presidente John Kennedy com um AR-15 quando este lhe é apresentado.

A situação ficaria mais tensa quando estudos mostraram que 7 soldados armados com AR-15 tinham a mesma capacidade combativa de 11 soldados armados com M14. Em 1962 o pedido da USAF é aceito para a compra de 8.500 AR-15. No final do mesmo ano, 1.000 fuzis seriam enviados aos conselheiros americanos que atuavam no Vietnã do Sul e para equipes selecionadas do exército sul vietnamita. Esses fuzis foram testados em combate real contra o Viet Cong. Não tardou para todos preferirem o AR-15 ao invés das submetralhadoras Thompson, fuzis M1 Garand e carabinas M2.

Histórica foto onde mostra soldados sul vietnamitas no início da guerra. Note o soldado da direita em pé com um AR-15, do lote enviado no começo da guerra para avaliação.

Os primeiros combates mostravam um fuzil confiável, embora não usado em grande escala e com uso árduo. Mas mais do que isso, esses combates mostravam a potencialidade do 5,56 x 45 mm. Os conselheiros americanos, assim como os soldados sul vietnamitas, passaram a notar ferimentos sérios e graves nos inimigos. Os ferimentos muitas vezes arrancavam membros inteiros do corpo. Outras vezes, grandes orifícios de saída eram formados no corpo. Outras vezes, por dentro do corpo, havia uma série de grandes ferimentos que praticamente dilaceravam os órgãos internos. Disparos na cabeça a faziam praticamente explodir. Esses efeitos foram encontrados em combates de até 200 metros.

Na Índia os americanos fizeram testes com crânios humanos, onde completaram eles com gelatina balística. Foram usados os primeiros AR-15 com disparos a 50 metros de distância. Para isso, usaram filmadoras de alta velocidade para poder ver quais os efeitos que o projétil faria na cabeça de um inimigo. Os fotogramas foram impressionantes mostrando o violento efeito que o projétil tinha ela alta velocidade e energia cinética.

Fotogramas de um vídeo de alta velocidade mostrando o efeito de um disparo de AR-15 a 50 metros contra um crânio. Note que praticamente fica destruído.

 

A USAF é a primeira a comprar o AR-15

Maio de 1962. A USAF adota o AR-15 e faz a sua primeira encomenda de 8.500 fuzis. Em 1963, um novo pedido de 19.000 fuzis seria feito. Nesse momento, também ocorre uma alteração de nomenclatura do calibre. O .223 passa a ser distribuído no mercado civil enquanto que USAF o adota como 5,64mm (5,56 x 45 mm). Caro Leitor, isso mesmo, 5,64 mm. Ainda em 1962, mais 20.000 fuzis são encomendados para os conselheiros americanos e tropas sul vietnamitas. Esses pedidos vieram numa ótima hora. A Colt estava à beira da falência e dependia de um contrato em solo americano.

AR-15 em uso pela USAF.

No Vietnã os primeiros fuzis AK-47 são capturados e enviados aos EUA. Os americanos decidem fazer uma comparação simples entre o AR-15, AK-47 e o M14. O AR-15 se saía como o melhor fuzil. O mais simples, o mais leve, o mais preciso e com maior controle em rajadas. Para o espanto de todos, o M14 ficara em último lugar já que o calibre de maior potência teria um resultado diferente. Isso fez acender a luz vermelha nos EUA. O M14 estava começando a sua produção em massa e já se mostrava defasado. Diante disso, decidem fazer um teste mais sério e profundo com essas mesmas armas em várias regiões e intempéries.

Eles tinham somente 5 AK-47 para testes e 5.000 munições. Mais 20.000 munições chegariam da Finlândia e os testes foram… Suspeitos. A começar que tentaram roubar a pontuação final para o M14. O M14 era um modelo melhorado, com um compensador diferente e muitos dos disparos foram feitos com bipodes enquanto que o AR-15 não tinha tais facilidades. Para piorar, fizeram uma campanha depreciativa com o AR-15. Em disparos a longas distâncias com o M14 (7,62 x 51 mm), era comum ver pedaços de terra, madeira ou outro objeto voarem quando o projétil impactava no alvo. Com o AR-15 (5,56 x 45 mm) isso não acontecia por causa do peso do projétil. Então se dizia que o AR-15 tinha um calibre fuzil anêmico e que isso teria abalado o moral da tropa. Ocorre que todos que atiraram com o AR-15 preferiam em sua unanimidade o AR-15 justamente por conseguir acertar o alvo com mais facilidade que o AK-47.

Conselheiro americano no início da guerra com um AR-15.

Outro problema foi a trajetória do projétil. O projétil do 5,56 x 45 mm tem uma trajetória reta eficaz de até 480 metros. O 7,62 x 51 mm tem um alcance de trajetória eficaz de 800 metros. Nas análises disseram que a trajetória do AR-15 era menor que o M14. Oras, mas é óbvio, são calibres diferentes! Embora com uma trajetória menor, a do calibre 5,56 x 45 mm era mais reta, coisa que o 7,62 mm OTAN não tinha como atributo já que fazia um grande arco. Esse é o problema de comparar armas com calibres e canos diferentes porque os resultados sempre serão diferentes. Como era de se esperar, o AR-15 não era perfeito. Houve panes de tiro que ficou mais tarde provado que o problema era a munição e a mira tinha um problema de baixa visualização do alvo em ambientes escuros, como no final da tarde ou de noite. Impera dizer que toda mira fixa de uma arma tem os mesmos problemas em ambientes escuros.

Após os testes ficou claro e notório que o AR-15 era muito mais eficaz que o M14. As coisas mudaram então. Decidiram comprar entre 50 e 100 mil fuzis AR-15. Para mostrar ainda mais o reconhecimento, ficou estabelecido que a produção do M14 seria diminuída gradativamente. E ainda assim manteriam um programa em andamento chamado SPIW – Special Purpose Individual Weapon, que visava um novo fuzil que empregasse o regime automático com mais eficácia. Programa este que durou décadas sem resultado algum.

Para as empresas que produziam o M14, isso significava perder uma fatia gorda de dinheiro. Diante disso, a TRW, uma das empresas contratadas para fazer o M14 (suas versões eram de ótima qualidade) tenta em vão adaptar um M14 para o calibre 5,56 x 45 mm. O resultado não deu certo, o único protótipo se mostrou grande e pesado.

M14 adaptado ao 5,56 x 45 mm.

Em janeiro de 1963, é anunciado o cancelamento do programa M14, onde receberiam apenas o último lote contratado. Para o exército é comprado um total de 85.000 fuzis AR-15. Entretanto, a prioridade era os soldados embarcados em helicópteros, tropas especiais e paraquedistas. O programa SPIW ainda estava em andamento e deveria fornecer o fuzil de assalto definitivo. A versão dara era que o AR-15 seria um fuzil de assalto temporário até o fim do programa SPIW.

AR-15 usado no Vietnã.

Antes da produção em massa, o fuzil recebe 130 alterações no seu desenho técnico. E corrigiram um problema observado nos testes. O calibre .223 surgiu com base em um calibres civis para a caça de pequenos animais. A própria equipe da ArmaLite fez as alterações necessárias para chegar no que julgavam ser o calibre ideal militar, o 5,56 x 45 mm. Um problema foi a falta de comunicação entre a Colt e a Winchester (que fazia a munição) quando ambas trabalhavam com n.ºs diferentes, o que podia gerar diferenças de pressão na arma, gerando assim maiores riscos de acidentes. Ocorre que a munição gerava determinados valores enquanto que o fuzil suportava outros valores. Agora os n.ºs são iguais nos calibres 5,56 x 45 mm, não oferecendo riscos.

 

AR-15

Calibre: 5,56 x 45 mm e .223
Comprimento total: 990 mm
Comprimento do cano: 508 mm
Cadência teórica de disparo: 700-800 dpm
Peso: 2,8 kg
Carregador: 20 cartuchos

 

Como funciona

Após apertar o gatilho e efetuar a deflagração do cartucho, os gases que percorrem o cano entram em um orifício na altura da mira. Esse orifício direciona os gases para um êmbolo sem pistão. Os gases percorrem esse êmbolo diretamente para a parte de trás do ferrolho. Os gases, chegando, pressionam o transportador do ferrolho para trás ao mesmo tempo em que ele vira para a esquerda. Isso faz com que o os ressaltos do ferrolho se alinhe com as saliências da câmara do cano, destravando o ferrolho.  Ainda com a força dos gases, o transportador do ferrolho é deslocado para trás, onde, ao mesmo tempo, ejeta a cápsula deflagrada.

O transportador do ferrolho chega ao final do seu curso, onde, por uma mola recuperadora localizada logo atrás e alojada em um tubo na coronha, passa a empurrar o transportador do ferrolho para frente. Nesse momento de volta, o ferrolho coloca um cartucho novo na câmara do cano. Agora os ressaltos do ferrolho entram na base do cano e se alinham com as saliências da câmara do cano, rotacionando o ferrolho para o lado direito, travando com os ressaltos na câmara do cano. Agora o fuzil está pronto para o próximo disparo.