G11 – Parte 2

Alta probabilidade de acerto

Em regime automático, a cada disparo o grupo todo se locomove com uma cadência de disparo de 450-500 dpm. Porém, no regime de burst o sistema funciona de forma diferente. Visando uma alta probabilidade de acerto no 1º disparo, a cadência de disparo deveria ser a mais alta possível. Para isso temos a combinação de dois fatores, disco ferrolho e grupo do cano travado. No burst, após o primeiro disparo, o grupo do cano, carregador e mecanismo de disparo se locomove para trás mas não volta em seguida. O 1º disparo gera gases da queima do propelente que apenas faz girar o disco ferrolho realizando o ciclo, onde ao mesmo tempo o percussor deflagra o 2º cartucho que já foi inserido no movimento do disco, em que seus gases, por sua vez, faz girar pela 3º vez o disco ferrolho, deflagrando o 3º cartucho ali novamente inserido. Note que a cada disparo o disco é girado onde um cartucho é inserido automaticamente. Neste momento o grupo do cano, carregador e mecanismo de disparo volta para frente, travando o fuzil para o próximo disparo. No burst, como não há movimento do grupo do cano, apenas do disco, a alimentação é bem mais rápida, no qual o burst tem uma cadência de disparo de 2.000 dpm. Em resumo, a cada disparo, o disco gira 3 vezes onde são inseridos 3 cartuchos disparados consecutivamente.

Durante o disparo, o grupo se locomove para trás junto com o carregador. Parece ser um único disparo, mas na verdade, foram feitos três disparos.

O G11 tinha um amortecedor de recuo desde sua concepção justamente para atuar com esse regime de burst de alta cadência. E isso era um grande diferencial para os requisitos do projeto. Como o sistema de burst exigia uma alta cadência de disparo, o recuo seria sentido em partes pelo soldado, mesmo que o conceito de alta velocidade do disparo o fizesse sentir o recuo de 1 ao invés de 3 disparos. Uma forma de atuar parte desse recuo era o sistema de amortecimento de recuo, que muitas vezes é confundido com um sistema a gás de pistão. O que não deixa de ser, mas age de forma independente do mecanismo de disparo e com finalidade completamente diferente.

Após o disparo, parte dos gases é direcionada a esse êmbolo localizado embaixo do cano. Dentro dele há um pistão com uma mola envolta. Os gases, ao entrar no êmbolo, empurram esse pistão para frente, no sentido da boca do cano, e não no sentido contrário, como se fosse acionar o mecanismo de disparo. Os gases empurram esse pistão para frente, fazendo uma energia contrária ao movimento de recuo, que é para trás. Isso ocorre no sistema semi e automático. No sistema de burst, esse pistão é empurrado ainda mais porque os gases gerados são muitos e gerados de forma muito rápida. Desta forma esse pistão é empurrado ainda mais para frente para compensar o excesso de energia em um movimento contrário ao do recuo.

G11.

Como dito, a munição 4,7 x 33 mm tinha alta tolerância com temperaturas extremadas. Isso não era só por questões de segurança no transporte e manuseio. Essa tolerância existia pelo cookoff, quando altas temperaturas da câmara do cano deflagram a munição sem acionar a espoleta. Porém, em fuzis convencionais, a cada disparo a cápsula deflagrada recebe parte do calor gerado e é expelida logo em seguida, levando embora esse calor e atenuando o aquecimento da câmara do cano. Com a munição 4,7 x 33 mm, a câmara do cano serve como cápsula. A cada disparo, essa câmara recebe o calor da munição e não se dissipa já que ela não é ejetada. A cada cartucho disparado, a câmara recebe esse calor e não tem como direcionar esse calor para algum lugar. Isso faz com que o mecanismo de disparo esquente mais rápido do que em fuzis convencionais. Quando as temperaturas passam do limite, mesmo o propelente tendo uma resistência maior a temperaturas, ocorria o efeito cookoff no G11, onde o fuzil disparava sozinho sem o soldado acionar o gatilho. E caso estivesse em burst, 3 disparos seriam feitos sem o soldado acionar o gatilho.

Havia alguns pontos negativos sobre o G11, porém, coisas mínimas. A alavanca, ou melhor dizendo, a roda de manejo era incômoda. No lado esquerdo do fuzil havia uma roda onde o soldado puxava uma pequena tampa e dava duas voltas para municiar e armar o fuzil. Esse movimento era muito silencioso se comparado com os fuzis normais. Porém, era muito incomodo porque nos fuzis normais o acionamento da alavanca de manejo era muito mais simples e rápido. Outra coisa questionável foi o uso de baioneta. O G11 é um fuzil de assalto com o formato de uma caixa. Empunhar uma arma com esse layout para usar uma baioneta é algo completamente ruim e nada ergonômico.

 

G11 K1

O fuzil foi colocado em testes a partir de 1988 como modelo G11 K1 (que nada mais era do que a versão final do fuzil), um total de 15 fuzis foi usado. Como era esperado, o fuzil de assalto conseguira a meta. O soldado conseguia um alto índice de acerto com os primeiros disparos. O disparo era um pouco diferente do normal. Quem atirou com o fuzil diz que, em burst, o recuo é um pouco maior do que em semiautomático. Esse recuo se parece com o recuo de um 7,62 x 51 mm. Se levarmos em conta que em um único recuo desses foram disparados 3 projéteis, é um recuo completamente tolerável e controlável.

G11 K1. Note a alavanca de manejo em forma de disco.

Em 1989 um lote de 500 fuzis foi repassado para testes na Alemanha nas mais variadas condições e os resultados foram excelentes. Os testes com o G11 K1 foram variados. Areia, neve, terrenos úmidos, secos, todos esses elementos foram usados com o G11. E o G11 se mostrou perfeito. Em climas quentes, o calor e os gases internos da queima da munição podiam ser colocados para fora da caixa da culatra por uma válvula localizada na parte de baixo. Isso se mostrou muito útil.

Não só o fuzil como a munição também foi testada. Foi acondicionada na neve, areia, temperaturas altas, baixas, com muita umidade e não foi observado problemas com ela. Ainda mais fizeram um teste de resistência, onde um C-160 Transall lançava caixas grandes de madeira por paraquedas. Essas caixas continham grandes estoques da munição 4,7 x 33 mm. E para o espanto de todos, a munição não se deformava com o impacto. Logo em seguida eram usadas nos G11 e funcionavam perfeitamente.

Testes do G11 K1 por tropas de montanha.

Bem naquela época ocorria nos EUA o programa ACR que havia surgido em 1986. Ao contrário do que se pensa, a missão não era encontrar um substituto para o M16 mas sim estudar novas tecnologias e formas de aquisição de alvo para um futuro substituto do M16. Participavam a AAI, Steyr, Colt e HK. Esta entrou com o G11. Há que ser dito, o G11 ACR tinha o mesmo calibre do G11 europeu. Ocorre que a forma de medição adotada pelos americanos era diferente, gerando a nomenclatura de 4,92 x 34 mm.Os calibres têm as mesmíssimas dimensões do projétil, de tal ordem que é o mesmo 4,7 x 33 mm. Os americanos usam pontos diferentes para fazer a medição.

G11 K1 avaliado por tropas americanas.

A diferença estava na mira, com graduação de 300 e 600 metros. O G11 ACR foi amplamente testado por tropas americanas do exército e da força aérea e foi considerado o melhor dos fuzis. Por semanas essas armas foram disparadas continuamente e foi o que teve menos pane, maior facilidade de operação e maior concentração de disparos no alvo. Entretanto, o programa foi encerrado em 1990 por corte de custos.

 

G11 K2

Levando em conta o feedback das tropas alemãs com os testes do G11 K1, a HK passou a trabalhar em cima de uma versão aprimorada ainda em 1989, originando assim o G11 K2. Levando em conta o sucesso de acertos da versão K1, os alemães fazem alguns refinamentos internos para que o recuo fosse mais bem controlado pelo sistema do grupo do cano, carregador e mecanismo de disparo, pelo amortecedor de recuo e pelo centro da gravidade do fuzil. Os testes mostraram que a precisão tinha aumentado de forma significativa em relação a versão K1.

G11 K2.

Uma reclamação dos que testaram O G11 K1 era a mira. A mira era boa, funcionava, era limpa e fazia a aquisição do alvo de forma rápida. Não tinham o que reclamar disso. Mas reclamavam da falta de versatilidade. A versão K2 passa a ter essa mira ótica destacável, assim o soldado poderia colocar uma mira telescópica, uma mira noturna ou, caso estivesse em operação hoje, as novas miras óticas e holográficas. Por exemplo, no K1 a mira noturna deveria ser colocada em cima da mira ótica, uma coisa nada prática.

G11 K2.

O carregador foi alterado para 45 cartuchos ao invés de 50 cartuchos. A razão era a praticidade para o soldado. As munições caseless vinham condicionadas em clips de 15 cartuchos. Para carregar, o soldado colocava esse clipe na boca do carregador e puxava o clipe, colocando de uma vez 15 cartuchos no carregador. Assim ficaria mais fácil para contar a munição e completar o carregador. Sem falar na questão logística do transporte e acondicionamento da munição.

A simplicidade do fuzil ficou clara com a tropa. Como o fuzil era muito mais simples, a instrução da tropa também ficou mais simples. E a tropa aprendeu a usar o fuzil em menor tempo se comparado com o G3 e HK33. Não havia tantas peças móveis, cantos vivos, teclas e alavancas. Eram os comandos básicos e nada mais. Entretanto, 1991 foi um ano de grandes mudanças para a Alemanha Ocidental.

G11 K2.

 

Final desmerecido

O G11 teria fácil 30 anos de serviço pela frente caso fosse adotado em 1990. E caso tivesse entrado em serviço, ainda seria um fuzil referência se comparado com os fuzis atuais (2018). Entretanto, em sua maioria, fatores de ordem puramente financeira decretaram o seu fim. O fuzil ainda precisava de alguns refinamentos, principalmente para solucionar o problema do aquecimento do disco ferrolho que algumas vezes gerava o efeito cookoff.

O programa chegava num ponto da história que mudou muita coisa na indústria bélica. Era o fim da guerra fria. Em 1991, o governo alemão teria de enfrentar alguns problemas políticos e sociais que exigiriam muito dinheiro. A começar pela unificação da Alemanha. Com a unificação, a Alemanha deveria arcar com o valor de dois exércitos já que o exército da então Alemanha Ocidental e Oriental passavam a ser um. Isso significava no mínimo o dobro de fuzis que seriam feitos, ou seja, significa o dobro de dinheiro necessário para a compra do G11.

G11 K2.

Outro problema eram os estoques de fuzis da Alemanha Ocidental. Ela ainda contava com centenas de milhares de G3 e outras dezenas de milhares de HK33, sendo que estes eram relativamente novos. Com o fim da guerra fria não havia a urgência e necessidade de trocar todos esses fuzis por um modelo mais novo e caro. A nova ordem econômica ditou o fim do G11 porque, pós 1991, a Alemanha teve de arcar com muitos custos após a reunificação. Sem a ameaça vermelha, o programa G11 deixou de ser uma prioridade e passou para 2º plano. Com o passar dos anos e a economia crescendo muito pouco, o G11 se mostrou caro. Em 1993 o programa do G11 é cancelado.

Não só o fuzil mas sua munição também. Estudos feitos no final dos anos 80 mostraram que o custo seria alto demais para essa munição. A matéria prima usada era cara e o custo de produção era caro, mesmo em uma escala industrial definida. Não era de interesse de a Alemanha passar algo que ela mesma passou na 2ª G. M., quando tinha o StG44, uma arma revolucionária, mas não tinha a munição em quantidade suficiente para a guerra.

Um dos protótipos de 1981.

O G11 foi um fuzil muito à frente do seu tempo, se levar em conta a concepção da ideia ainda dos anos 60. O conceito a que se propunha era tão radical que fez os soviéticos investirem em sistemas semelhantes sem sucesso, chegando ao AN-94, onde este tinha forte influência justamente do G11 pelo uso da alta cadência de disparo. A ideia era tão radical que ninguém no ocidente conseguiu fazer algo parecido que funcionasse. Hoje existem poucos modelos e estão presentes em alguns museus.

 

HK G11 K2

Calibre: 4,7 x 33 mm caseless
Comprimento total: 750 mm
Comprimento do cano: 540 mm
Cadência de disparo: 450-500 dpm. Em burst, 2.000 dpm
Peso: 3,5 kg
Carregador: 45 cartuchos

 

Como funciona

Após colocar o carregador, o soldado gira a alavanca de manejo no lado esquerdo do fuzil. Ao fazer isso, um cartucho é colocado dentro do disco ferrolho na posição vertical e em seguida, com o movimento da rotação da alavanca de manejo, é alinhado com o cano, girando 90ª até a posição horizontal. Após o disparo, os gases percorrem um curto caminho onde entram em um orifício localizado um pouco mais à frente da base do cano. Os gases são dirigidos a um pequeno êmbolo localizado abaixo do cano. Nesse momento, o conjunto do cano, carregador e mecanismo de disparo também retrocede um pouco atrás.

Esse êmbolo direciona os gases por um pequeno duto que é ligado ao mecanismo de disparo, onde os gases são dirigidos para girar o disco. Pelo giro do disco, uma mola atuante faz o cartucho entrar na câmara enquanto gira. Durante esse processo, o disco gira 90º e nivela na posição horizontal, enquanto que o conjunto do cano, carregador e mecanismo de disparo se move para frente, travando o fuzil. No sistema de burst, o grupo do cano, carregador e mecanismo de disparo fica retido atrás e só volta à posição normal após o 3º disparo.

 

Curiosidade

O sistema do G11 era tão revolucionário e promissor que logo se pensou em fazer uma metralhadora leve de apoio com a mesma munição. Para tanto, essa versão metralhadora teria um grande carregador que seria colocado dentro de uma grande coronha. O carregador teria 300 cartuchos. Esse modelo não passou de mockup.

Mockup da metralhadora leve de apoio G11.
O grande carregador ficaria dentro da grande coronha.