AUG

Não há como negar. O AUG foi na época um quebra de paradigmas. Não só no layout como no conceito de fuzil de assalto. Nasceu desacreditado e hoje se firma como um dos melhores fuzis feitos até hoje, ainda sendo usado quando muitos outros fuzis de sua época já foram substituídos. O AUG cumpre bem para o que foi feito. Um fuzil de assalto sem nenhuma limitação.

 

Origens

A guerra do Vietnã havia mostrado a grande praticidade e flexibilidade do calibre 5,56 x 45 mm ao mostrar um calibre mais leve e de recuo menor permitindo maior controle da arma, assim como maior quantidade de munição. Isso fez muitas empresas bélicas acompanharam isso com muita atenção. A Áustria sempre quis estar na vanguarda das armas de fogo e sabia que o conceito do fuzil de batalha StG58 não duraria muito tempo. Em 1958 a Áustria optou por fabricar sob licença o FAL. Naquela época, muitos países adquiriram fuzis de assalto em 7,62 x 51 mm conforme a filosofia da época e a Áustria tinha acompanhado a avaliação da então Alemanha Ocidental com o G1, onde este tinha se mostrado muito simples e confiável. Verificando a simplicidade e a chance de ser fabricado localmente, a Áustria optou pelo FAL.

StG.58. Note o guardamão de metal.

Mais que o calibre, a guerra tinha mostrado o valor de um conceito de um calibre realmente intermediário e isso foi o que mais chamou a atenção dos austríacos. Vários países europeus mostraram interesse nos calibres mais leves e alguns projetos de calibres surgiram no horizonte. A Áustria sabia que tinha de se renovar e no começo dos anos 70 passaram a ver qual a melhor maneira de partir para um calibre mais leve, por um projeto próprio ou por adoção de um fuzil de assalto pronto.

Uma das maiores inspirações para os austríacos foram os ingleses com o fuzil E.M.2. Este fuzil era uma grande inovação para a época e só foi posto de lado por forte influência americana ao negar tanto o fuzil como o calibre inglês .280. Este calibre havia sido considerado realmente intermediário. Mas mais do que isso, ele adotava um perfil muito prático. Era um fuzil de linha reta, com uma mira ótica mais levantada e bullpup. Uma arma mais prática, mais compacta e mais flexível. Isso fez com que a Áustria tomasse base para seu futuro fuzil de assalto algo simples, compacto e flexível. Além disso, queriam uma maior simplicidade e portabilidade do fuzil. Eles notaram que, embora neutros, talvez teriam de enfrentar as tropas do Pacto de Varsóvia e notaram que eles estavam armados com os AKs e AKMs, armas muito simples e baratas, o que davam ampla vantagem em movimentos de assaltos contra tropas armadas com o FAL em um calibre mais pesado.

E.M.2. Esta arma serviu de inspiração quanto ao conceito bullpup e de aquisição de alvo. Note o perfil reto do fuzil.

Assim em 1974 surgem os primeiros requisitos para o desenvolvimento desse fuzil. Primordialmente ele deveria ser mais leve que o StG58. Deveria ter controle em rajadas curtas para operações de assalto e apoio. Deveria ter a troca de canos de forma rápida e sem o uso de ferramentas especiais. Deveria se evitar ao máximo o uso de ferramentas para montagem e desmontagem da arma, sendo que o uso de pinos era o mais desejável. O grupo de gatilho deveria ser o mais simples possível, tanto para a manutenção como o barateamento da produção. A arma deveria ser leve e menor, para uso da infantaria, tropas especiais e tripulações de veículos. Eram muitas variáveis para um único fuzil.

Surge em 1975 o 1º protótipo conceitual do fuzil de assalto.  O conceito era um bullpup com uma mira telescópica e uma empunhadura frontal. O próprio alojamento do carregador funcionaria como empunhadura. Apenas se visava ver como seriam as dimensões e o mecanismo de ferrolho. Não havia capacidade de disparo.

O 1º protótipo era apenas conceitual. Não tinha a capacidade de disparar.

Esse modelo serviu de base para um 2º protótipo. Esse modelo mostrava que seria incômodo demais usar o carregador como empunhadura. A mira telescópica continua no conceito, mas é usada uma mira fixa normal. Ocorre que nesse protótipo ocorrem os primeiros testes de disparo para ver como se comportaria o mecanismo de disparo e como seria a controlabilidade do fuzil. É de se notar que neste protótipo não existe guardamato convencional. Adota-se um modelo que cobre toda a mão para a proteção do gatilho.

O 2º protótipo recebe a capacidade de disparo. É usada mira fixa de forma mais convencional.

Em 1977 surgem mais dois protótipos. Para esses protótipos surgirem tão rápido é porque o conceito era completamente viável e os engenheiros austríacos estavam indo no caminho certo. O 1º modelo agora contém um guardamato que cobre toda a mão do soldado. Neste modelo são estudadas as miras e compensadores, assim como a disposição dos botões de operação. O 2º modelo visa apenas a ergonomia do fuzil relativo às suas dimensões. No 3º protótipo ainda não existe uma mira ótica porque nesse ínterim estavam vendo qual seria o melhor tipo de mira a ser usado no fuzil de assalto. Foi no 4º protótipo que se usa uma nova mira ótica.

O 3º protótipo dá a forma do AUG.

Nessa mesma época é feita na Áustria uma comparação entre o último protótipo e outros fuzis de assalto para avaliação. Foram usados como modelos comparativos o M16A1, o VZ58 no calibre 7,62 x 39 mm e o FN CAL. Os testes realizados mostraram que o protótipo austríaco funcionava perfeitamente e, em outros pontos, superava os demais concorrentes, como o controle em rajadas curtas e simplicidade de manutenção. Não tardou para a Áustria selecionar esse modelo como seu fuzil padrão.

O 4º protótipo. Há uma readequação do mecanismo interno. Note a mira ótica.

O fuzil passa por mais um refinamento, incorporando agora uma mira telescópica definitiva. Em 1977, o fuzil era apresentado e adotado oficialmente em 1978. O AUG vinha de Armee Universal Gewehr, em uma tradução direta, fuzil universal do exército. Na Áustria ele foi adotado como StG 77,  Sturm Gewehr 77.

 

AUG

Em 1978 é feita a 1ª encomenda de 80.000 fuzis. Levando em conta os testes de 1977, e os planos ainda da elaboração do conceito, a Steyr passa a projetar outras versões, como submetralhadoras, carabinas e metralhadoras leves de apoio, tendo o fuzil de assalto como prioridade na produção. O AUG, embora com um projeto visualmente radical e completamente funcional, foi inspirado por várias armas quanto ao seu conjunto interno.

AUG.

O que mais chamou a atenção foi a configuração bullpup do fuzil, bem em uma época que alguns bullpups não passavam de protótipos. Isso foi graças ao E.M.2 que impressionou os austríacos ainda nos anos 50. A combinação bullpup com uma mira ótica na forma de alça de transporte era algo futurista. E para deixar a coisa toda mais impactante, o fuzil era quase inteiramente de polímero em uma época que só se empregava madeira e metal. A Steyr usou muito o nylon 66 que se mostrou como um plástico de alta resistência, esse material dava uma maior leveza e durabilidade para o fuzil, o que foi muito elogiado.

Se olharem com atenção, verão que o AUG tem uma cor clara, uma mescla de verde claro com bege. Isso não era um golpe de marketing. Os austríacos fizeram estudos sobre camuflagens e observabilidade. Nesses estudos eles notaram que um fuzil de assalto completamente preto poderia ser notado a distâncias maiores como uma arma. Ao adotar uma cor mais clara, a arma se camufla não só com o uniforme do soldado como o ambiente ao seu redor. De perto não faz diferença, mas a médias e longas distâncias, dificulta a localização do soldado. Essa baixa observação foi redescoberta no final dos anos 2000 por outros exércitos em seus estudos mais direcionados para isso.

Tropas austríacas recebendo o AUG.

O AUG dispunha de um pequeno guardamão situado logo à frente do guardamato e, mais à frente, uma empunhadura vertical que podia ser rebatível horizontalmente. Alguns fuzis de assalto já tinha esse tipo de empunhadura, como a versão romena do AK-47. Entretanto, a empunhadura vertical não era um acessório de marketing, era uma necessidade para aproveitar ao máximo o conceito bullpup. Como o mecanismo de disparo está dentro da coronha e o gatilho praticamente no meio do cano, se tem pouco espaço para o soldado esticar o braço para um guardamão convencional. Pelo centro de gravidade mais para trás e apoiado no ombro, fica muito mais fácil para o soldado empunhar e mirar com a empunhadura vertical porque seu braço esquerdo está mais perto do peito, onde os braços formam um “V” e fica mais fácil empunhar verticalmente do que horizontalmente. Caso o soldado quisesse, poderia posicionar essa empunhadura na horizontal, mas não fica muito prático de usar o fuzil assim.

Com o conceito bullpup e sua ergonomia no layout, o AUG se mostrou ótimo para uma rápida aquisição de alvo. Isso porque, em um fuzil de linha reta, a mira situada mais alta, próxima à altura do olho do soldado, fazia com que ele, ao mirar a arma, já estivesse com a mira na altura do olho. Isso tornava a reação mais rápida. É usada uma mira telescópica fixa de 1,5x. Essa mira torna mais fácil a visada do alvo, assim como a aquisição do mesmo, tornando o disparo mais rápido e eficaz. A mira ótica tinha um retículo fixo no visor. Esse retículo está graduado para até 300 metros.

AUG. Ao levar o fuzil ao ombro, o soldado já tinha a mira na altura do olho e próximo. Isso facilitava muito na resposta de tiro.

Levando em conta a precisão do fuzil, até 300 metros não havia que alterar a graduação em virtude da trajetória mais plana do calibre 5,56 x 45 mm. A mira tinha boa claridade e o soldado podia mirar com os dois olhos abertos. Isso é importante porque a mira com o olho fechado forma a visão de túnel, com a imagem apenas da lente. Com os dois olhos abertos, enquanto o soldado faz a mira na lente, ele usa a visão periférica para ver o que se passa ao redor. A mira tinha um ponto preto como retículo e a sua borda preenchia uma pessoa de 1,80 m de altura a 300 metros. Era por isso que era fácil e rápida a aquisição de alvo, pois ela estava graduada para um padrão pré-estabelecido.

De cima para baixo, da esquerda para direita. A mira em 100 metros. Em 200 metros. Em 300 metros e em 500 metros. O círculo dará a referência de escala e distância.

Acima disso o soldado poderia graduar a mira até 800 metros. Em caso de pane ou dano e o soldado não puder usar a mira ótica, ela tem em cima uma mira convencional fixa de emergência, com alcance de até 100 metros. Alguns fuzis recebiam tratamento com elemento radioativo trítio nessa mira fixa, onde brilhava em ambientes de baixa luminosidade. Era uma revolução para um fuzil de série na época.

Note a mira de emergência do AUG. Note também os belos olhos da bela mulher.

Por ser um dos primeiros fuzis de assalto bullpup, todos perguntaram. E como fará o soldado canhoto? O problema do fuzil bullpup é que pode acontecer das cápsulas deflagradas acertar a cara do soldado pela janela de ejeção estar mais próxima da face. A Steyr pensou nisso mirando a minoria canhota. A forma de solucionar isso era permitir ao soldado a possibilidade de alterar o lado da janela de ejeção. O procedimento era simples e sem a necessidade de ferramenta especial. Bastava o soldado tirar o pino de desmontagem, puxar a soleira da coronha, tirar o grupo do mecanismo de disparo. Colocava a janela de ejeção para o lado que queria e posicionava o extrator para o lado contrário. Montava de novo e fechava. Era um processo simples feito com as mãos em poucos minutos.

Sistema de suma importância a ser comentado. O seletor de regime de disparo. Pois bem, o AUG não tem um seletor de disparo. Mas como operar? Os austríacos desenvolveram um sistema de percurso de gatilho. Ao apertar o gatilho até a metade, o fuzil dispara em semiautomático. Se o soldado apertar o gatilho até o final do curso, o fuzil dispara em automático. Há uma tecla acima da empunhadura onde está a trava da arma. Com o primeiro dedo (dedão) você destrava e com o 2º dedo (indicador) você trava.

A Argentina é um dos usuários do AUG.

Na época, assim como hoje isso é algo incrível. Mas na prática pode não ser. No calor do disparo, na adrenalina, é muito difícil o soldado controlar o gatilho. A todo o momento ele estará preocupado que se puxar mais a arma atira em automático. Isso pode ser ruim, pois caso ele solte uma rajada sem querer, ele acaba de perder a visada do alvo. Isso tem acontecido pouco com as experiências ao redor do mundo, mas é algo que vez ou outra acontece e para tanto exige-se mais treino e cuidado do soldad.

Uma alegação para esse sistema de gatilho, além da simplicidade de uso, é que em caso de uma emboscada ou de uma ação rápida de assalto, o soldado estaria apto a disparar no automático sem ter que se preocupar com um seletor físico de disparo. A desvantagem desse tipo de mecanismo de disparo é que o grupo do gatilho é mais complexo de manter, é mais caro de produzir, assim como exige mais treino do soldado. Outro ponto negativo nesse tipo de gatilho é a tolerância para quedas. Quanto maior a altura, maior a chance de disparo acidental. Nesse sistema de gatilho, com mais peças no mecanismo, maiores as chances de um disparo acidental.

E há um mito que tomou a forma de uma falsa verdade que generalizou todos os fuzis bullpups. O peso do gatilho do AUG é mais pesado e, deste modo, todos os demais bullpups tem gatilho pesado. Isso é uma falácia descomunal. O gatilho do AUG é um pouco mais pesado por causa do sistema de duplo disparo do grupo do gatilho. No disparo semi, o de meio curso, há que se ter uma maior pressão no gatilho gradativa antes de acionar o automático, no final do curso do gatilho. É uma trava para evitar pressões iguais em regimes diferentes. Se o gatilho fosse mais leve, o soldado teria dificuldade para saber quando é semi ou automático, gerando uma confusão ainda maior.

Tropas austríacas treinam com o AUG.

Embora na época a HK aparecesse com sistemas de bursts, e o M16A2 surgia no horizonte com esse sistema, a Steyr optou por não usar isso. Ocorre que o sistema de burst surgiu como forma de aumentar as chances de acertar um alvo com uma rápida rajada. Entretanto, para que esse efeito ocorra o fuzil tem que ter uma alta cadência de disparo, coisa que o AUG, assim como todos os outros demais fuzis convencionais, não o tinha. Entretanto, caso algum cliente estrangeiro queira, pode ser adicionado esse sistema no fuzil. Como não existe seletor de disparo, esse sistema substitui o antigo sistema de gatilho. Apertando o gatilho até meio curso, o fuzil dispara em semi. Apertando até o final, o fuzil dispara um burst de 3 disparos. Não há opção para disparo automático.

O AUG tinha um regulador de gases na ponta do êmbolo. Em situações normais, parte dos gases vai para o êmbolo e outra parte é expelida para fora dele. Entretanto, em situações de elementos que possam obstruir o êmbolo, como areia, neve ou sujeira leve, o soldado pode fechar parte da captação dos gases, jogando mais gases para o êmbolo e menos gases para fora. Isso gera uma maior pressão do êmbolo que, por sua vez, aciona o pistão com mais força, fazendo o transportador do ferrolho se movimentar com mais força. E por fim, o soldado pode fechar totalmente o êmbolo de gases. Isso é feito para o disparo de granadas de boca na qual é necessário um cartucho especial com uma carga menor de propelente e sem projétil. Com o êmbolo fechado, não se tem o ciclo do fuzil porque nenhum gás entra no êmbolo para evitar sujeira, já que esses cartuchos geram uma sujeira maior que os cartuchos normais.

O AUG pode ser usado em condições árduas de sujeira.

A troca dos carregadores é algo mais simples do que se pensa nos fuzis bullpups. O retém do carregador é ambidestro e está localizado bem atrás do carregador. Em um movimento rápido se aciona o retém com a mão já segurando o carregador a ser inserido. O carregador do AUG inaugura uma tendência usada até hoje. O carregador de material plástico semitransparente permite ao soldado ver a quantidade de munição que lhe resta. Ainda mais, esse carregador de plástico de alta resistência é mais duro e confiável que os modelos do M16. O problema é que carregadores novos do AUG precisam de um tapa mais forte para encaixar por causa das presilhas do carregador. Com pouco tempo eles se adéquam ao fuzil.

Tropas alpinas austríacas. O AUG se mostrou excelente pela sua leveza e tamanho menor.

Um ponto negativo. Após o último disparo o ferrolho fica aberto. Isso é bom porque informa ao soldado quando acabou a munição ou se trata de uma pane. O soldado tem uma informação mais rápida do fuzil. Porém, o fuzil não tem um retém do ferrolho. Para que o ferrolho seja solto, o soldado tem que puxar a alavanca de manejo levemente para trás e soltá-la. Quando fizer isso, o ferrolho fechará automaticamente. Isso atrasava um pouco a troca de carregadores, porque após a troca, com a mão que carregou o fuzil tinha de acionar a alavanca de manejo. Caso o soldado fosse canhoto, o movimento era mais incômodo ainda. Faltou no fuzil um botão de fácil acesso para o retém do ferrolho.

Soldados austríacos com o AUG. O fuzil opera sem problemas em regiões com neve.

Outro elemento que não era ambidestro era a alavanca de manejo. Essa alavanca fica no lado esquerdo do fuzil. Há que se levar em conta que a maioria dos soldados é destra. Não é nada complicado para o soldado canhoto acionar a alavanca. A alavanca de manejo não era solidária ao transportador do ferrolho por causa do layout do mecanismo de disparo. Alavancas solidárias ajudam o ferrolho a fechar caso algo o obstrua. Aqui, logicamente, falamos de sujeira leve. Caso isso aconteça, o soldado não fica desamparado. Na alavanca de manejo existe um botão que, quando pressionado, uma trava aciona a ponta da haste da alavanca dentro do tubo. Com ela presa, o soldado consegue fechar manualmente o ferrolho. Após isso, basta soltar o botão que o fuzil volta a funcionar normalmente.

Olhando o AUG de cima, verão que há o cano e, ao lado dele, existem dois tubos. Há certa confusão quanto a isso porque, olhando uma intersecção de lado, aparenta que não existe tubo de gás no AUG. Em cima temos dois tubos. Esses dois tubos estão ligados diretamente ao transportador do ferrolho. Pois bem, o tubo do lado esquerdo contém a haste de metal com uma mola envolta que funciona como a alavanca de manejo. No tubo do lado direito, existe um pistão de gases com uma mola em volta. Dois tubos, duas hastes, duas molas, duas funções diferentes, mas uma função em comum. Quando se dispara, os gases do cano entram nesse êmbolo de gás no lado direito. A pressão dos gases impulsiona o pistão que, por sua vez, impulsiona o transportador do ferrolho para trás. Se olharem com atenção, atrás do transportador do ferrolho não existe uma grande mola recuperadora. As duas molas que estão nos dois tubos funcionam como molas recuperadoras.

Note as duas hastes ligadas ao transportador do ferrolho. A do lado esquerdo a alavanca de manejo e no lado direito o pistão. Cada haste tem uma mola em que as 2 molas funcionam como molas recuperadoras.

Desde o começo o AUG foi feito com base na modularidade, algo que há havia sido defendido pelo sistema Stoner 63. O AUG é uma plataforma da qual existem outras versões da mesma arma. Para isso, bastava trocar o cano. Dependendo da missão seria necessária a troca do cano ou a inclusão de algum acessório. O AUG foi o 1º fuzil de assalto modular adotado. Diante dessa necessidade, a troca do cano era realizada sem nenhuma ferramenta e de forma rápida. Com o carregador retirado, aperta-se o botão de desmontagem acima do carregador. Destaca-se com a mão o cano e o grupo da mira. Puxa-se um pino e se retira o cano. Coloca outro cano, coloca o pino. Coloca-se o grupo da mira. Aperta o botão de desmontagem para travar. Pronto. Esse processo se faz em menos de 1 minuto. Isso é muito importante porque caso tenha que trocar o perfil da missão, troca-se o cano imediatamente. Caso o cano da metralhadora leve esteja muito quente, troca-se o cano. Isso é muito vantajoso no campo de batalha.

Com base na modularidade, os austríacos optaram por não adquirir uma metralhadora leve de apoio em calibre diferente. Levando a padronização da munição, não haveria a necessidade de outra munição para evitar armas diferentes e uma cadeia logística mais complexa. Este conceito hoje está em voga. Com a rápida troca de cano, o AUG poderia sair de um fuzil de assalto ou carabina para se tornar uma metralhadora leve de apoio. O cano tem 630 mm, o que dá maior alcance, precisão e energia pelo maior aproveitamento dos gases. O cano maior ainda evitava o efeito cookoff. Este efeito ocorre quando a temperatura do cano é tão alta que o cartucho na câmara do cano é deflagrado sem ação do soldado, apenas pela temperatura.

Soldados irlandeses com o AUG. A Irlanda não adotou o L85 em virtude da série de problemas que a arma tinha. Assim compraram o AUG que se mostrou muito acima no quesito qualidade.

Os austríacos usavam a metralhadora leve com dois tipos de cano. Um cano normal de 630 mm e outro de mesmo tamanho, mas mais pesado. Com um ou outro, os austríacos ainda disparam essas armas com uma mira telescópica de 6x. Pode parecer estranho, mas o fogo de supressão tinha uma precisão maior que as armas automáticas em 7,62 x 51 mm, se mostrando como uma arma muito flexível. Caso um soldado fosse dedicado ao fogo de supressão e apoio, o AUG tinha parte do mecanismo de disparo trocado (operação sem ferramentas de poucos minutos). O AUG passava a disparar com o ferrolho aberto.

Nesse método o ferrolho fica aberto a cada disparo, ou seja, retraído na parte de trás da caixa da culatra. Isso faz perder um pouco a precisão, mas permite a circulação de ar entre o cano, evitando o aquecimento do cano quando em fogo de supressão. Usando o sistema de ferrolho fechado, o AUG tinha um pequeno problema. Em rajadas curtas contínuas, o cano aguentava até 150 disparos em automático, devendo esperar 5 minutos para esfriamento com o ferrolho puxado ou trocar o cano. Esse uso árduo fazia a caixa da culatra esquentar mais que os fuzis convencionais, o material plástico não absorvia completamente o calor.

HBAR. H de heavy. É o AUG com um cano maior e mais pesado, para servir como metralhadora leve de apoio. Essa arma dispara com o ferrolho aberto.

O uso do AUG pelos austríacos foi excelente. Em um primeiro momento foi um choque e criou-se muito ceticismo sobre o AUG. Os austríacos estavam acostumados com o grande e pesado FAL, com sua munição pesada e recuo forte. Quando receberam o AUG, era algo fora de série. Uma arma muito menor, mais leve, de plástico e formato radicalmente diferente, onde jocosamente a apelidaram de brinquedo. Não tardou para verem a praticidade do AUG em ação. Arma mais leve, maior quantidade de munição, uma precisão maior, simplicidade de manutenção e rápida aquisição de alvo. Isso não conseguiam com o FAL. Esse mesmo caminho foi notado pelos australianos em 1985 quando adotaram o AUG como fuzil regular, denominando-os como F88. Assim como os austríacos, eles também haviam operado o FAL e o impacto da transição, positiva, foi o mesmo.

Na metade dos anos 70, os austríacos acreditavam que a baioneta não seria mais usada, não tendo mais valia nenhuma. A versão austríaca do AUG não tem encaixe para baioneta, mas versões de exportação têm. Todos os fuzis têm encaixe para lançadores de granadas, como o M203. No final, o AUG foi vendido para mais de 40 países, incluindo exércitos e órgãos de segurança. Adotado pela Áustria oficialmente em 1978, a Tunísia foi o 1º país a comprá-lo com um pedido de 70.000 fuzis ainda em 1978 também.

AUG. Note a posição do soldado à direita. A posição é mais simples e discreta, sem expor tanto o soldado.

 

AUG A1

O AUG era um fuzil de conceito completamente funcional. Entretanto, com o uso pelas tropas, era normal que os pontos negativos surgissem com o tempo. Notaram um problema no transportador do ferrolho do fuzil. Pelas dimensões mais enxutas, durante os disparos, era comum o transportador do ferrolho gerar um grande atrito com a parte de cima da caixa da culatra. Esse atrito era completamente normal e esperado. Porém, os engenheiros notaram que esse atrito desgastaria prematuramente não só o transportador do ferrolho como o conjunto interno da armação de alumínio.

AUG A1.

A forma de contornar isso era adicionar um pequeno rolamento entre o transportador do ferrolho e a parte de cima da caixa da culatra. Isso fazia o transportador do ferrolho deslizar de forma mais suave, sem o atrito exacerbado que se tinha antes. Isso gera uma menor manutenção e uma durabilidade maior para o fuzil. A versão A1 também passa a permitir uma versão dedicada para o tiro noturno, essa versão já vem com um trilho próprio para a mira noturna. Para usar a mira ótica, há que se trocar o grupo da mira. O fuzil passa é oferecido em outras cores como preto, verde e bege.

 

AUG A2

Nos anos 90 começam a surgir o emprego de acessórios e miras diferentes com o uso de trilhos picatinny. O AUG não tinha tanta opção de encaixe já que o seu layout fora concebido para ser o mais simples possível. Era uma questão de tempo para que a necessidade de trilhos no AUG surgisse e assim os austríacos, em 1996, pegam um AUG A1 como modelo para ser alterado.  Era muito inconveniente o soldado ter de tirar o grupo da mira toda vez que quisesse usar uma mira diferente. Era um processo que exigia tempo de desmontagem do fuzil para que isso fosse feito.

AUG A2.

Em 1997 a Steyr lança o AUG A2. Nada mais era que o mesmíssimo AUG A1, porém, com a introdução de um trilho picatinny M1913 na parte de cima do grupo do gatilho. Não há mais a mira ótica fixa. Isso dá maior praticidade ao soldado, pois ele pode continuar usando a mira ótica de 1,5x. Caso queira usar outra mira, basta trocar com o auxílio de uma ferramenta, sem a necessidade de desmontar o fuzil.  Esse trilho pode ser adaptado aos antigos AUG e AUG A1. Muitos fuzis mais antigos foram retrofitados com esses trilhos.

AUG A2. Note a posição dos braços. Dá o apoio para um tiro mais preciso e confortável que só pode ser alcançado com fuzis bullpups.

Outra alteração foi na alavanca de manejo. Antes, havia um botão que, quando pressionado, ele travava na ponta da haste da alavanca de manejo e servia como forma de fechar manualmente o ferrolho. Visando simplificar essa peça, a nova alavanca não tem mais esse botão. Basta o soldado movimentá-la para frente que, por um sistema de pivô, ele trava essa ponta da haste, fazendo o trancamento manual do ferrolho.

 

AUG A3

O uso do AUG em combate real trouxe alguns aprendizados. O uso do trilho picatinny na altura do grupo da mira estava se mostrando insuficiente. Insuficiente porque só aquela parte da arma podia receber miras e acessórios de forma rápida e prática. Isso foi corroborado quando a arma era usada em ações CQB, onde fazia a falta de mais acessórios, como lanternas, miras laser ou outras miras óticas. Diante disso, a Steyr lança em 2009 o AUG A3.

AUG A3.

Essa versão não foi feita visando o mercado externo em um primeiro momento. Ela visava a tropa especial austríaca Jagdkommando que necessitavam de uma arma mais flexível. O AUG A3 nada mais era que um AUG com maior aplicação de trilhos picatinny. A parte de cima da caixa da culatra no AUG se mostrou como uma área pouco utilizável. Desta forma a Steyr aplica um grande trilho picatinny sobre ela. Na ponta do fuzil, também foram colocados mais dois pequenos trilhos picatinny nos lados esquerdo e direito.

Outra alteração que foi feita e que foi muito bem elogiada foi a adição de um botão para o retém do ferrolho.  Até então, após o último disparo, o ferrolho do AUG permanecia aberto. O soldado, para liberá-lo, tinha de puxar levemente a alavanca de manejo para trás e soltá-la em seguida. Isso era um incômodo porque o soldado perdia tempo fazendo isso. No AUG A3 a Steyr coloca um retém do ferrolho no lado esquerdo do fuzil, acima do retém do carregador. Esse comando não é ambidestro. O novo método simplifica a operação do fuzil e agiliza a troca do carregador.

O soldado a esquerda porta um AUG A3.

Quando o soldado vai fazer a troca do carregador, com a mão que segura o carregador, coloca um carregador cheio no alojamento do carregador. Logo em seguida, com a mesma mão e no mesmo movimento, aciona o retém do ferrolho que, por sua vez, fecha o ferrolho colocando um cartucho dentro da câmara do cano ao mesmo tempo, deixando a arma pronta para o disparo. Se em operações normais esse sistema foi muito elogiado, em operações CQB esse sistema foi festejado pela praticidade e rapidez.

AUG A3 com um lançador de granadas de 40 mm.

O AUG A3 permite que o soldado use vários dispositivos na mesma arma, como mira ótica, apontador laser, lanterna, etc, o que lhe for melhor. O sucesso do emprego do AUG A3 pelo Jagdkommando chamou a atenção dos operadores estrangeiros do AUG que logo encomendaram essa versão. Pelo desenho técnico do sistema, fuzis mais antigos não podem ser simplesmente adaptados com as novas alterações dos desenhos técnicos internos.

 

AUG A3 SF

As tropas especiais austríacas usaram muito o AUG A3 e gostaram do uso do trilho picatinny. Para eles, este trilho é importante, é funcional e deve ser usado. Porém as tropas regulares gostavam do uso da mira de 1,5x. Eles fizeram algumas recomendações de uma atualização no fuzil para que a mira pudesse ser usada com o trilho sem o sacrifício dela. Em 2007 a Steyr desenvolve um modelo para as tropas especiais, o StG-77A2. Era um modelo exclusivo das tropas especiais austríacas. Com o sucesso do modelo, em 2010 a Steyr oferece no mercado como AUG A3 SF. SF de Special Forces, ou forças especiais. Esse modelo não visava diretamente o exército regular, mas não tardou para que exércitos comprassem pequenos lotes, tanto para soldados comuns como tropas especiais.

AUG A3 SF.

O modelo SF nada mais é do que um AUG A3 com arranjo diferente dos trilhos picatinny e o grupo da mira. A mira ótica de 1,5x é mantida. Porém, os trilhos são colocados por toda a tampa da mira. É colocado um pequeno trilho no lado direito e esquerdo da mira e outro pequeno trilho no lado direito do fuzil, na parte de metal acima do gatilho. Essa é a diferença mais impactante no projeto. Entretanto, o SF permite que haja uma versão em que um trilho picatinny seja instalado entre a mira e a tampa da caixa da culatra. Só pela extensão da mira, por um trilho pequeno, e não por um grande trilho como no modelo A3 anterior.

AUG A3 SF.

O soldado mantém a funcionabilidade da mira ótica. Se quiser, ele pode usar uma mira holográfica acoplada em cima dessa mira pelos trilhos. Nas laterais podem ser colocados apontadores lasers, lanternas ou medidores de distância. Não é um retrocesso manter a mira. O posicionamento dos trilhos tornou a arma mais prática porque muita parte do tempo o soldado não usa miras holográficas ou apontadores laser. Ficou mostrado que os austríacos tinham uma reação de resposta mais rápida quando a mira ótica de 1,5x estava acoplada no fuzil. Esta versão não tem o modelo metralhadora leve. O modelo SF tem canos de 365 mm, 407 mm e 508 mm.

oldado omani sendo treinado com o AUG A3 SF.

Steyr AUG

Calibre: 5,56 x 45 mm
Comprimento do cano: 508 mm
Comprimento total: 790 mm
Cadência de disparo: 680-850 dpm
Peso: 3,8 Kg
Carregador: 30 cartuchos

 

Como funciona

Ao disparar, os gases são captados por um orifício no lado direito do fuzil. Os gases vão para um êmbolo, no lado direito, onde comprimem um pequeno pistão que está dentro desse tubo. Esse pistão é ligado ao transportador do ferrolho. As pressões fazem o ferrolho rotacionar para a esquerda, alinhando com as saliências da base do cano. Uma vez alinhadas, o ferrolho se solta da base do cano, movimentando o transportador do ferrolho para trás, ao mesmo tempo em que expele a cápsula deflagrada.

O AUG não tem uma mola recuperadora atrás do transportador do ferrolho, como em outros fuzis. As duas molas dentro desses dois tubos descritos funcionam como molas recuperadoras, a mola da alavanca de manejo e a mola do pistão de gás. Após retroceder, o transportador do ferrolho é impulsionado para frente por essas duas molas recuperadoras. Durante o movimento para frente, o ferrolho coloca um cartucho na câmara do cano. Logo em seguida os ressaltos do ferrolho passam pelas saliências da base do cano, rotacionando para a direita, travando o ferrolho na base do cano, ao mesmo tempo em que arma o percussor, estando pronto para o próximo disparo.

 

Curiosidades

No começo do programa o AUG era designado como UIW – Universal Infantarie Waffen, algo como Arma universal da Infantaria.

A Malásia e a Austrália produzem o AUG sob licença. Em 1985 a Austrália assinou com a Áustria o direito de produção e foi adotado oficialmente em 1988 como F88 Austeyer. Além do mais, a Austrália exportou o F88 para a Nova Zelândia. Em 2013, uma nova versão do F88 foi lançada, o Enhanced F88. As diferenças primordiais com a família AUG são: janela de ejeção maior, apoio para a face do soldado, gatilho com novo desenho, sistema que bloqueia o gatilho de dois estágios, guarda mão maior com orifício para gatilho do lançador de granada, retém do ferrolho localizado atrás do carregador nas laterais, retém do carregador localizada na frente do gatilho e alavanca de manejo que se dobra para cima.